Fisiologia da Audição e do Equilíbrio nos Mamíferos Domésticos
Fisiologia da Audição e do Equilíbrio nos Mamíferos Domésticos
1. Introdução
A audição e o equilíbrio são funções essenciais para a sobrevivência dos mamíferos domésticos, permitindo a interação com o ambiente e a manutenção da postura corporal. Ambos os processos são mediados pelo sistema auditivo e vestibular, estruturas complexas localizadas no ouvido. O presente texto explora os aspectos anatômicos, histológicos, bioquímicos e fisiológicos da audição e do equilíbrio nos mamíferos domésticos, bem como as áreas do sistema nervoso central envolvidas nesses processos.
2. Aspectos Anatômicos e Histológicos
2.1. Estruturas do Sistema Auditivo
O sistema auditivo é composto por três partes principais: o ouvido externo, o ouvido médio e o ouvido interno.
- Ouvido Externo: Inclui o pavilhão auricular e o canal auditivo externo. Sua função principal é a captação e direção das ondas sonoras para o ouvido médio.
- Ouvido Médio: Contém os ossículos auditivos (martelo, bigorna e estribo) que transmitem as vibrações sonoras da membrana timpânica para a janela oval do ouvido interno.
- Ouvido Interno: Inclui a cóclea, que contém as células ciliadas responsáveis pela transdução sonora, e o sistema vestibular, fundamental para o equilíbrio.
2.2. Histologia das Estruturas Auditivas
A cóclea é revestida pelo epitelio sensorial do órgão de Corti, onde se encontram as células ciliadas que convertem os sinais mecânicos em impulsos nervosos. Essas células são cobertas pela membrana tectória, que amplifica as vibrações.
Células ciliadas: Localizadas no órgão de Corti, convertem estímulos mecânicos em impulsos elétricos.
- Membrana tectorial: Facilita a ativação das células ciliadas.
Estria vascular: Responsável pela produção da endolinfa.
2.3. Estruturas do Sistema Vestibular
O sistema vestibular compreende os canais semicirculares, o utrículo e o sáculo, que contêm células ciliadas envolvidas na detecção de acelerações lineares e angulares.
3. Mecanismos Fisiológicos e Bioquímicos
3.1. Transdução dos Estímulos Sonoros
- As ondas sonoras fazem vibrar a membrana timpânica.
- A vibração é amplificada pelos ossículos auditivos e transmitida à janela oval.
- A movimentação da perilinfa e endolinfa dentro da cóclea provoca a deflexão das células ciliadas no órgão de Corti.
Essa deflexão ativa canais iônicos, permitindo a entrada de K+ e Ca2+ e gerando um potencial de ação nos neurônios do nervo coclear.
A audição envolve as seguintes etapas:
Captura do som pelo pavilhão auricular.
Transmissão das vibrações pela membrana timpânica e ossículos.
Movimento da perilinfa e endolinfa dentro da cóclea.
Ativação das células ciliadas no órgão de Corti.
Conversão do estímulo mecânico em potencial de ação pelo nervo coclear.
Processamento central no córtex auditivo.
3.2. Transdução dos Estímulos Vestibulares
Os canais semicirculares detectam rotação da cabeça, enquanto o utrículo e o sáculo percebem aceleração linear. A movimentação da endolinfa desloca a cúpula e provoca a ativação dos receptores sensoriais.
O equilíbrio é mantido por:
Vestíbulo: Contém o utrículo e sáculo, sensíveis à aceleração linear.
Canais semicirculares: Detectam movimentos angulares.
Reflexos vestíbulo-oculares: Ajustam a posição ocular para manter o foco durante o movimento.
Os sinais do sistema vestibular são processados pelo tronco encefálico e cerebelo, integrando informações visuais e proprioceptivas.
4. Sistema Nervoso Central e Integração Sensorial
A audição e o equilíbrio envolvem áreas específicas do SNC:
Córtex Auditivo Primário: Interpreta os sinais auditivos.
Núcleos Vestibulares: Integram informações sensoriais sobre posição e movimento.
Cerebelo: Atua na coordenação motora e manutenção do equilíbrio.
Tronco encefálico: Integra reflexos auditivos e vestibulares.
Hipotálamo: Regula a homeostase interna relacionada ao equilíbrio.
5. Estudos de Caso
5.1 Estudo de Caso: Perda Auditiva em Cães
Contexto Clínico
Um cão idoso, da raça Cocker Spaniel, apresenta dificuldade em responder a comandos e sinais sonoros.
Sinais Clínicos
Falta de resposta a estímulos auditivos.
Desorientação leve.
Vocalização excessiva.
Diagnóstico Diferencial
Degeneração coclear senil.
Otite média/interna crônica.
Ototoxicidade.
Neoplasia auricular.
Exames Complementares
Otoscopia: Avaliação do conduto auditivo e membrana timpânica.
Audiometria de resposta evocada do tronco encefálico (BAER): Confirma a perda auditiva neurossensorial.
Tomografia computadorizada ou ressonância magnética: Avaliação detalhada do ouvido médio e interno.
Discussão
A degeneração progressiva das células ciliadas na cóclea reduz a percepção sonora. O BAER confirma a ausência de resposta neural ao som, indicando surdez neurossensorial. O manejo envolve adaptação comportamental e estratégias de comunicação visual.
5.2 Estudo de Caso: Distúrbio do Equilíbrio em Bovinos Causado por Infestação de Hábitat Auricular por Rhabitidis
Contexto Clínico
Uma vaca leiteira adulta apresenta inclinação da cabeça, prurido intenso na região auricular e dificuldade de locomoção.
Sinais Clínicos
- Inclinação da cabeça para um dos lados.
- Coçação intensa e irritabilidade.
- Movimentos incoordenados e dificuldades na marcha.
Diagnóstico Diferencial
- Infestação por Rhabitidis.
- Otite parasitária grave.
- Meningoencefalite bacteriana.
Exames Complementares
- Inspeção e otoscopia: Presença de larvas de Rhabitidis.
- Exames laboratoriais: Hemograma e PCR para infecções secundárias.
- Exames de imagem (radiografia/tomografia): Avaliação da orelha média e interna.
Discussão
A presença de Rhabitidis no canal auditivo causa inflamação severa e afeta o sistema vestibular. O tratamento envolve a remoção manual, lavagem auricular com soluções antissépticas e antibioticoterapia em caso de infecção secundária. O prognóstico é favorável quando a infestação é detectada precocemente.
6. Glossário
Cóclea: Estrutura espiralada do ouvido interno responsável pela audição.
Células ciliadas: Neurônios sensoriais especializados na detecção de som e movimento.
Membrana tectorial: Estrutura gelatinosa que interage com as células ciliadas na cóclea.
Endolinfa: Fluido rico em potássio presente no ouvido interno.
Perilinfa: Fluido semelhante ao líquido extracelular presente na cóclea.
Vestíbulo: Estrutura do ouvido interno envolvida no equilíbrio.
Nistagmo: Movimentos involuntários dos olhos, indicativos de distúrbios vestibulares.
Ataxia: Falta de coordenação muscular devido a disfunção neurológica.
Ototoxicidade: Dano auditivo causado por substâncias químicas ou fármacos.
BAER (Brainstem Auditory Evoked Response): Teste para avaliar a função auditiva em animais.
7. Conclusão
A audição e o equilíbrio são processos altamente especializados, dependentes da integração de sinais mecânicos e neurais. Alterações nesses sistemas podem levar a perda auditiva e desordens vestibulares, impactando significativamente a qualidade de vida dos animais domésticos. O conhecimento detalhado desses mecanismos é essencial para o diagnóstico e manejo de afecções otoneurológicas na prática veterinária.
Veja aqui o texto sobre outros sistemas sensoriais nos animais domésticos.